sexta-feira, 13 de março de 2009
quinta-feira, 5 de março de 2009
sonsa
a minha voz lendo ele
por sobre as letras meus olhos viram
te recitam
a mão se contém na sala de aula
tua língua viva me roça o papel
do ouvido
tragando as coxas
dentro cálida
por fora uma página pálida
segunda-feira, 19 de janeiro de 2009
autobiografia
e têm algo a dizer
mesmo que não falem nada
as coisas da minha vida
somadas às coisas da sua vida
mais a vida dos outros
é base de muita conversa
papo-furado de botequim
roteiro de filme
mesmo os nomes, usamos
sem pedir licença
tá tudo em família
(por sorte, ninguém aqui me quer mal)
e o dito hoje
passados os anos
que efeito?
eu, que em botequins fui ingrata
fui meretriz, fui fraude, fui ladra
estou hoje sendo lida com gosto pelos bebuns
estou hoje bebendo com gosto sua posição
é a vida
uns vêm, outros vãos
eu, que sempre estive cabisbaixa, enxovalhada
escrevendo minha impotência ante a hipocrisia
escárnio sem pretensão
me dando ao luxo de sorrir
nesse mundo de filha da puta
mas todos, amigos,
sabemos que tem coisa que se fala sem pensar.
sabemos da grande mãe relatividade,
que olha por nós agora e na hora de nossa morte
que olha por nós quando pecamos
quando maldizemos
quando praguejamos
e mentimos
porque todos mentimos
com esse nosso riso sentido e maquiado
porque todos não entendemos o porque
mas nos viramos uns contra os outros
e nos pusemos outros contra os outros
e com isso aprendemos como se dirige o mundo.
quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
bem branquinho
a temperatura que nos abandona ao estro o amor
desvelando assimetrias de alguém que nos permita o hoje
e nesse dia outro o sol respira
e os edifícios ofegantes não percebem não desabam
eles nos deixam flexíveis e encostados
por ocasião da atmosfera embaraçada dos motivos
(para o sebastião, com palavras dele, só dele)
sábado, 29 de novembro de 2008
longe dos motivos e das sobras
por ocasião da manhã descoberta entre o ofício dos pássaros
e o meu
a temperatura branca em cada mínimo abandono que nos recebe
inclusive do amor ao estro do amor inclusive
porque certo respiro basta
o azo de lavar a voz com o dia fasto a água que te ilumina
por parte do sol que me dispara em confissão de completude
a mesura assimétrica de um silvestre mais íntimo
que nos concede atender e ancorar
inclusive o torpor de cada acerto inclusive
porque justo bebedouro o é a casa que te levanta a manhã
e me germina
.
sexta-feira, 17 de outubro de 2008
da fertilidade e do precipício
Um espeto, um peso, um aviãozinho de papel, um papel, um estilhaço. Tinta vermelha, folha de estanho. Quinze pras cinco, meu deus, meu deus. Não se demore, não seja breve, cale-te aos poucos e puxe para si o que te dei e não me coube jamais. Possua como Deus marionetes, como o vaso um jardim potencial que engana a flor engana a flor.
Ser teu abrigo? Não, primavera, não me cause tanta cor, peito que ressente o vaso fértil e pouco, tão adúltera, tão vasta vista, a gravata às seis da manhã e é tanto o número, tanta a hora, tanta a letra que o telhado se me curva e empena as portas para quem puder entrar.
terça-feira, 14 de outubro de 2008
libélula
um pouco
sexta-feira, 10 de outubro de 2008
vespertino
como eu rejeito essa torta
essa quase simétrica eu gosto
no meio do teu livro
um pássaro rasante feito raia
o vento ondinando ele
a copa imensa dava três árvores
feito galhos, a gente se entrelaça suspensa
qualquer coisa a gente vai praquela outra
e dali, um cara nos tirou do respiro
fui embora pra casa meio de anteontem
aquela vela tanta no chão
a lumeeira de dentro
um jasmim-manga
a mais e uma vida
terça-feira, 7 de outubro de 2008
poema para partir
entretanto o luzeiro são ruídos que faço
na atmosfera embaraçada no destino na fala
encosta os teus gestos flexíveis na parede
vê se o resto do edifício desaba
a escrita é uma visitação abandonada
arruda rosa
sá donãna põe a veia no lugar
o sol se aguçando no ombro dele
chega
nome de bicho eu lembro de manso
de assustado de esquecido de medo
que nunca tiveram fim na mata cheia
as histórias do meu corpo negro
e grosso e encarnado
no corte do meu cabelo feito de fogo
e reses
vaqueirinho sebastião que peço lume
sá menina é boa gorda de coragem
a vereda mudando pro sossego no joelho dele
chega
nome de estrela eu sei de ponta
de rabeca e de besouro
que deram fim na areia arruda
rosa do tempo
e figas
segunda-feira, 22 de setembro de 2008
sob os olhos
o que me faz reclinar
as costas os punhos
saltando dentro a lente o orifício
a bilha o diamante o saco as contas
o susto a ordem o desemprego
taquicardia
me faz reclinar a declinação das cadeiras
a caveira as pestanas
o latim genérico
postos fora os óculos
toda a epiderme suga de longe
os fatos o tapa o erro
a música, a nossa música
que vêm de fora
sexta-feira, 22 de agosto de 2008
de volta
quando eu era triste e feliz
a minha bebida preferida acordando os balões
e a cacimba velha velha de rocios claros
quando havia tu ânfora tenra para toda sede
sabes que a terra é grande
jocunda que não importa o relento
a que as escolhas direito vão dar
o meu feitio é de espera e magma
e aro
que haja tu paineira prenha ao sol sebe
quando eu abro sua boca e me estou à mão
é então que eu sou feliz e sou triste
e o teu contorno vai no céu e volta
segunda-feira, 18 de agosto de 2008
onze-horas
e tudo de mim se desata do lírio
espero um dia de sol
e estou sentado à sombra
quanto mais eu leio
mais vazia a folha à minha frente suplica
desnuda a cada linha que publico
a cada linha que escondo
a cada outra que nem deixo vir
pelo menos mais setecentas páginas
quarta-feira, 13 de agosto de 2008
segunda-feira, 11 de agosto de 2008
adornando
percebo o fluxo diferente de meus corpos
parece que mudam, corpo e mente, a tempo vário
e que me esqueço de quem sou
e me fui tantos que nem sou nem
sei apenas quantos passos fui afora
margeando covardia
"verão sagrado que sou"
verão que nada
todos de gelo pontiagudo
eu minhas pétalas
adornando túmulo
sexta-feira, 8 de agosto de 2008
"entregue suas palavras numa folha de aula"
poema de julia pastore
seus olhos pronunciam
meu filho
chutando de outra mãe
o seu que não assumi
por não assumir a mim o pai
ele terá meus olhos
que o buscaram por todo o vazio
(e teria sido o mesmo
com o ventre mais largo)
sim estou sentindo
algo que não amor mais
não nostalgia nem vontade
estou a sentir
estou a conjeturar o sim
os talvezes
e a viver os nãos
domingo, 27 de julho de 2008
Poema na Cantina
botão de mim mesmo
(universidade)
posso provar todas as formas os
aromas, as cores.
em um momento há que se
optar por uma para ser
e levar a amargura de todas as outras
para dentro da terra e fincar
raízes sedentas pó adentro.
não é para ser lírico
que eu meto o dedo na flor.
quinta-feira, 24 de julho de 2008
tapera taperinha
que eu assentei por cima da idade
tão encontrada na lasca de minha andança
na eira a lâmpada que forna uma voz
tua súbita voz sobre o rio da cura
taperinha que a madeira fazia minha
família toda de remanso e azul
podia bater palma pedir informação barbante
tapera que era de se esperar chuva
marcada para tinir dentro em quanto
da gente com o queixo no tempo
chega a estrada se larga em rima terçã
tapera taperinha
sexta-feira, 11 de julho de 2008
sumário para não esquecer que
as folhas tantas que encontrei descaminhado dos olhos eu
que de repente só eu seguia não podendo mesmo o afã
de ser pego por elas no recinto íntimo dos olhos sei
que pegá-las é já uma palavra uma companhia
se não as pude pegar várias assim pois ainda
elas eram em meu caminho a minha condição
que seguia sem me deter espalhado na presença em queda eu
colhia apenas no mirar e era breve e esquecia
se ficaram quantas sem o meu gesto a minha infância
se preciso era deixá-las no outono longo que fossem
que foi preciso conceder-lhes o relento de seus acasos vivos
deixar que sejam do tempo um silêncio mais fundo
diferentes dos meus cântaros os meus pasmos deveras
e as iniciativas minhas cheias de luas e destinos diferentes
dos meus abrigos e resguardos jesus tão abstratos
que era preciso compreender e respeitar a folha caída eu
em sua própria multidão despenteada e varrida
daqueles passos que nos provocam alguma menina mão
a desviar um pouco dos precipícios abertos por hábito
se era preciso achar as folhas em paz e muito esquecer
dentre aquelas que não iam do cansaço para o sumiço
e não foi possível romper com muitas todas as poucas vistas
pois foi precisar de algumas sem razão sem o medo
que tem saciedade sem torpor e sem memória
e pegá-las pela brecha do afeto na única respiração
no sumo do braço que se estende ao necessário ao santo
essas têm comigo um passo sincero uma provisão de tempo
foi um longo outono e não raro o pude compreender
nas meadas repletas que já se podem deixar pelas ruas
na viga de uma completude que se desfaz assim sem dor
se reaparece dentro dos livros e nos cadernos faz coincidir
nós com o que de fato amamos um gesto de logo voltar
à folha caída à companhia até de uma verdade tão lisa eu
guardado com o que há de virtude nas folhas todas
o meu coração no que somos mais equinócios e rebento
se com ela eu caminho para a concretude da minha casa
domingo, 29 de junho de 2008
porque revolucionário somente até os vinte e cinco anos
e porque em celebração nos conjugamos
pois que celebremos nossos dias
até hoje e tantos muitos
amém e por todos os séculos
somos glória nossa e de nossos pais
por tabela
por opressão incógnita
por opressão e glória
de quem me clame
de quem me julgue meu e me.
sábado, 28 de junho de 2008
lusco dos versos
amargo e triste por cousa
alguma e te encontro
ao menos encontro
qual ramos
amorfos ainda domingo
a parir esperança
alguma por entre as pernas
escorro líquida e absorventes
meus atos meus surtos
meus meus somente meus
e quando sigo ao alheio sou turva
e pouco me vale o que sou ao lírico
ainda que vivo soubesse a libido
ainda que fosse água límpida
e meu curso fosse de anil
e meu sábado de tequila
sal cerveja gelo limão
e me batesse o ponto das horas a fio
das noites em dia
todas em claro
em escala de trabalho
doze por trinta e seis
acordo às sete
visto-me às oito
salto do trem e fico
das dez às dezoito.
quarta-feira, 25 de junho de 2008
terça-feira, 24 de junho de 2008
azulescência
na boca do estômago estou lendo
e ajustando as cintas e pervertendo
você não perde por esperar eclodir
meu casulo
poder compactuar da sua morte do seu
sono da sua santidade
da minha fé tão estúpida
quarta-feira, 18 de junho de 2008
Receita de mel
hexágonos conglomerados de néctar.
elas, como eu, rebolam pra lá
e pra cá, mas elas se acreditam
ouvem e reproduzem os sons das asas
das outras e encontram flor de laranjeira
(quando não entram no meu guaraná)
depois, das formas rígidas semelhantes
onde moram onde cantam onde
namoricam
pinga mel
terça-feira, 17 de junho de 2008
sê-lo Divindade
segunda-feira, 16 de junho de 2008
poído
procuro a linha e as agulhas
elas devem estar aqui em algum lugar
se bem me lembro
meu pai me orientou que as pusesse por aqui
ele sabia que eu ia precisar
e eu dizia "não, pai, eu confio nessa máquina"
mas ele estava certo
"sim, você confia, mas deixe por aqui
como as velas e os fósforos em dia de falta de luz,
porque você também confia nas lâmpadas mais que nas velas"
pensando bem,
guardarei meus poemas a punho.
sexta-feira, 13 de junho de 2008
brilhando brilhando brilhando
eu tinha uma bala caída no chão da área
eu tinha um serviço de santo na minha testa
no meu colchão os cabelos de palha
o betume do parto o calçamento
misturado com o poste
sabes que há sangue no urinol
sabes que é uma resignação mofada de medo
no teu pedaço de abrigo a meia boca
o assunto todo esburacado pela parede
misturado na gente
são cadelas roçando as revistas capitais
são as pernas imbecis pelo chão
em nossos dentes oxidados a chave enfiam
uma notícia pelo bagaço da latrina
quinta-feira, 12 de junho de 2008
poema que ouvi na janela
é preciso cuidar da cabeça
porque o piolho é um bichinho que,
se deixar,
come o seu cérebro
então,
os meninos e as mamães,
vamos cuidar da cabeça.
escritor depois da quinta
pedirei ao analista que tome nota:
- são quinze anos de cintura mais alta,
pernas finas,
atenção difusa,
muitos livros.
quinze anos que meus hábitos me distanciam
desde em casa,
desde a casa em mim,
tome nota.
vinte e seis anos que não caibo em coisa alguma
nem nenhuma em mim
nem que a faça.
terça-feira, 10 de junho de 2008
do resto
do sol sobre o cesto
do alpendre prazer em viver a casa
boquiaberta para a dissipação
do resto
do mundo sustentado à beira de cada longe e ruído
a rua que aqui vai dar numa folhinha amarela lábios
hão de plantar um sono
hão de guardar os batentes do amor
justo sob a firme luminosidade
das ilhas
que desaparecem em algum lugar nos pensamentos
segunda-feira, 9 de junho de 2008
antes do almoço
nácar que insiste em ser toda a minha salva
um coração preciso
fosse deitar na minha boca extrema
vulcã a baba um dia doce e hialina ela abre
xícaras de quanto é bordado o rosto fogo
num bicho que eu canto cheiro
a mato alto e limpo
eu invado com o sangue essa flor
buril de fome exata e feitura inteira afeto
ela encosta abre seu nome em mim
redondo com uma saúde rufa lava
o meu apetite
domingo, 8 de junho de 2008
Como fruta madura que cai do pé
sábado, 7 de junho de 2008
sexta-feira, 6 de junho de 2008
miguel considera margarete
é para a perda que tudo flui
é na ausência que tudo floresce
claro claro
o coração dele se enche de alívio
quarta-feira, 4 de junho de 2008
segunda-feira, 2 de junho de 2008
a parteira
inveja e querença
estrelas minhas conceber-me teu técnico, por ti (e somente um tu) estar a transformar alquimista pacotes em alimentos. quando se dobra em mim a pessoa segunda (e tem sido segunda e dupla em mim também a primeira) a dos versos de sempre e a que em prosa se persona. furto-me o acreditar das coisas tão somente por não-inocência. quem me dera haver um relógio de ponto a soar minha hora de retorno. estaria acordada por instantes - instantes esses como o sono profundo de que sonhos não me lembro. pena de mim se buscasse auto-compreensão: tenho entranhas despejadas por uma ponta de esferográfica, escorrida pelos bueiros à beira da calçada.
acordar com chuva
não hoje nos dias que rumorejam
minhas amarras meus dedos
emporcalhados de uma triste esperança acordar
com chuva quando há sol no vão dos prédios
e a semana não desabou
sobre a inclinação das pendências
sobrecarregado estava o céu veemente
e enquanto dormias distraído da conspiração
de tuas águas mais escuras arrebentou-se
o silêncio fosco dos passeios privados
de tudo e deveras públicos
encharcando o ouvido do mais espesso
passado acordar com
chuva em pleno sol acordar seco
sólido acordar a manhã
limpa o coração tão estrondo
domingo, 1 de junho de 2008
uma abóbada importante
e zelava os contrafortes do amor
é estranho que abrevie na boca a imensidão do tempo
esse tempo roxo sem tamanho algum
porque já habitam árvores de páginas muito incertas
nas difusas velocidades da dor
e é provável que vocês nunca mais façam os olhos
desses olhos queridos ao longo do céu
para quem tinha acabado de perceber o atrevimento da morte
hora de atrelar um carro ao boi
chá das três (às três)
apanham
a folha molhada do chão
mastigo hortelã do teu vasinho
infusão
tua penumbra me é luz intensa
saio de mim
passageiro do banco de trás
modifico da crista à casta
por influência
quinta-feira, 29 de maio de 2008
fragmentos
no fundo não importa se há alguma metafísica em atirar um copo contra o chão, abrir uma fenda no tornozelo e deixar escorrer, não se sabe exatamente se há qualquer metafísica na própria, na tal, e é em minha Mãe vislumbro todas as coisas que fazem de mim o hoje venho sendo e que isso não é ruim, tudo passa, vai ficar boazinha logo, enquanto embalada por Ele encontro paz mesmo sem ter morada, mesmo com a testa um pouco arroxeada por tanta cegueira, eu sei que passa
Ézio sabe que precisa dormir e que há vida-fogo em seus quadris, se dói o dorso não é nada, vai ficar bonzinho logo, é só indigestão, agora ele aprendeu a orar, descobriu que não é necessária uma penitência nem joelhos nem mãos dando nós, só a palma na outra, conheceu sua conversa com Deus e agora entende que certas coisas são amargas, mas existem as framboesas, meu amor, para quê tanta urgência ? sem martírios nem maracujá, me dá uma aflição na língua, meu amor, uns arrepios na espinha, não preciso disso EU TENHO DEUS e se tu soubesses e n'Ele ousasses crer diria a ti que em meu quarto a criatura faz a si em estado de deslumbre espargindo brilhos e luzes de cores tão frias, tudo de uma beleza celeste e toco-Lhe a face grande muito grande ! posso perceber tanta braveza em mim depois que tudo se esvai, não há fumaça, não faz vezes de gênio em lâmpadas, vai flutuando e durmo com a soberba de quem sente muito mais porque assim Ele quis
portanto não há nada, não chores não, cuidado quando fores atravessar, observes com zelo os carros que passam parece que pouco importa, mas não, importa muito e nunca saberás porquê, sou Ézio-nascente e sofro de meus devaneios e pudores, mas importa. vai ficar boazinha logo, cuido de tua testa e enquando espalhas por tua face o sumo da fruta que injeto em ti, te tornas uma mulher tão perigosa e valente
deixo em ti meus brilhantes e sigo o tempo de mim e só quando Deus não se faz presente consigo refestelar teu corpo, pois a matéria de quem tenho sido aos poucos se esvai e cada vez mais, meu amor, cada vez mais DEUS VÊ A MIM.
- fragmento do (sic) conto "Ézio".
obs.: sinceras desculpas.
terça-feira, 27 de maio de 2008
os orientais entendem a música sob outros prismas. gosto porque, da primeira vez que ouvi, certos estigmas da composição musical em mim impregnados simplesmente desabaram. e eu ficava tonta tentando apanhá-los pelo chão, tão jovem ainda!, eles pulavam me enfeitiçando, me instigando. percebi que meus instintos-estigmas de proteção eram vãos e me deixei levar. nesse dia, foram doze horas de uma musicalidade justa e serena. doze horas de respiração alternada, de temperatura controlada, solas frias, olhar opaco, garganta seca e um copo d'água. foi, sim, em mim experiência única, mas não posso querer infringir o outro. não posso querer dar rótulos ao outro, e achar que com isso sei o que o outro pensa. cacete! pudera saber isso! pudera saber e manipular e tornar de meu grado! mas ninguém sabe.
*** esse blog tá catastrófico. saiam de perto das janelas.
segunda-feira, 26 de maio de 2008
devo passar a gola da camisa de trabalho, devo escolher o feijão e refogar o arroz, devo talhar o bife separando-me os nervos, devo passar a vassoura com pano úmido enrolado, devo deixar aberta a janela para entrarem as montanhas pela manhã, devo escovar os dentes antes de sentar ao computador, devo esperar um beijo um presente um jantar, devo sonhar com meus filhos saindo de mim para perto de mim todos eles, devo ligar ao meiodia com voz de cafédamanhã - e ser bomdia, de bomgrado, por todavida.
sábado, 24 de maio de 2008
sobre todas as coisas
se quiserem posso muito bem falar sobre flores, ninhos, animais. se quiserem eu posso o que EU bem quiser. posso brincar de ser teto, de ser folha, de estar certa. se assim bem quiserem, posso inventar que dá certo ser poeta, que é divina a tempestade de existir sendo como se é. posso pontuar o tempo todo, posso parar meu próprio tempo, posso buscar e transformar dor em sossego, eu posso estar em qualquer lugar que seja e ainda brincar de estar aí: olhe para baixo, os dois olhos são meus. eu posso encontrar descanso nessa noite tão bonita e adotar um desses cachorrinhos com olhos tristes redondos de bicho, eu posso ser em mim esses olhos e ninguém nunca vai perceber, nunca. eu posso nunca mais escrever a palavra paixão em nada que seja de mim e ainda assim virar infortúnio, ninguém sabe. vamos fingir todos que há alicerce na saudade e que é de clareza que a vida vive. faz de conta que eu nunca disse que nessa vida me faltava morrer um pouco porque ando sentindo falta até de adoecer. e se eu contar agora que falo igual nordestino e que finalmente psicografei Deus falando de solidão ? não digam por aí que eu fiquei biruta, nem digam que eu não encaixo porque não escrevo poesia, não faço verso, não faço mercê a mares azulentos e molhados. vamos todos brincar de porcelana e raxar um pouquinho, deixar escorrer, ganhar carinho ? vamos todos entender que ser homem não é sopa e que seria necessária a décima parte de muros abaixo para que houvesse, aqui em mim, um caminho
até aí
meu passo sendo leve:
fiz poema até sobre o chão que pisei - todos pisaram.
e ninguém sabe.
terça-feira, 13 de maio de 2008
ao que grita:
segunda-feira, 12 de maio de 2008
cético
rubro como ainda não os frutos dessa pimenteira -
seria trágico, arderia em mim
tanto quanto teu ano de espera
deixa-me roncar um sono de olho só
deixa-me acreditar que estou onde deveria
deixa-me
que estou a deixar-te tão certo quanto antes
não me fales em vontade
que de livre fiz-me indesmanchável
como a mácula que deixei de amor no teu corpo
um tanto meu
e que deixaste no meu
até o fim que não pode ainda haver
domingo, 11 de maio de 2008
sábado, 10 de maio de 2008
não é tão simples. não é tão simples, e o deixar-me fluir pode ser que me preencha em momentos. assim como em momento me preencheste tempestade. o xis é que os momentos de prazer e liberdade, tive, sim, ao teu lado. e os momentos que me encaminham ao que almejo ser/ ter, são todos aqui.
sexta-feira, 9 de maio de 2008
quarta-feira, 7 de maio de 2008
terça-feira, 6 de maio de 2008
domingo, 4 de maio de 2008
quinta-feira, 1 de maio de 2008
terça-feira, 29 de abril de 2008
amantíssimo cumpadre,
toma prosa - a despeito de política
- No meu tempo era chão de terra batida, pai me levava nas costas até a cama para não sujar o lençol, que também se passava à ferro na cama. Antes de dormir, aquele cheiro de sabão de coco tostado, cama quente e eu chorava de pena dele e ele me sorria.
- Me traz o jornal depois do café. Eu disse depois. A outra senhora que trabalhava aqui não deu certo por isso. Ela me fazia tudo atrapalhada, acabava que eu saia engolindo o jornal quente entrando no carro lendo borras de café, por favor. Veja bem: eu acordo, tomo banho, tomo café, leio jornal e saio, nessa ordem, todo dia. Mais nada. Você pode comer e assistir televisão. Chego às dezesseis. às dezesseis não apareça pela sala, não venha limpar o quarto, não exista. Vou sentar ao computador pois preciso terminar o romance.
- O senhor vai desmanchar com a moça do computador?
- Não... Estou escrevendo uma história, sabe, você nunca leu nenhuma história? Nem uma história do tipo bandido e mocinho?
- Sei, que nem novela da televisão, né? Li não senhor. Minhas filha sabe ler, graças a deus. Meu marido-que-deus-o-tenha também sabia. Mas eu fui criada com muita dificuldade, meus pais era caseiro da chácara da dona Maria, avó do senhor. Eles tomava conta de sua mãe, ensinava ela as coisa, e eu cuidava das coisa dela, arrumava as boneca, limpava a cômoda. Se eu estudo, a mãe do senhor nem era mãe do senhor talvez.
- Eu vou ver depois uma escola perto daqui com os colegas de faculdade. Assim você aprende a ler, já que minha mãe é minha mãe, sim? Agora faz-o-favor: são dezoito horas. Minha hora de falar com a Fátima. Desapareça e prepare uma sopinha bem leve, estou um pouco indisposto. O horário do jantar é...
- ... às vinte horas. Sim, senhor. O senhor é um anjo, seu Márcio, dona-Tania-que-deus-a-tenha que te abençõe ao lado de deus que ela deve estar. Como deve ficar orgulhosa desse filho tão bom. O senhor vem mesmo como deputado, que eu falo pra todo mundo na escola que o senhor é muito bom e eu voto no senhor. Imagina só, eu, com cinqüenta anos estudando! Nunca é tarde, seu Márcio, nunca é tarde!
Sai falando: "graças a deus! graças a deus!" Márcio resolve visitar a escola com o chefe de campanha.