quinta-feira, 29 de maio de 2008

fragmentos

no fundo não importa se há alguma metafísica em atirar um copo contra o chão, abrir uma fenda no tornozelo e deixar escorrer, não se sabe exatamente se há qualquer metafísica na própria, na tal, e é em minha Mãe vislumbro todas as coisas que fazem de mim o hoje venho sendo e que isso não é ruim, tudo passa, vai ficar boazinha logo, enquanto embalada por Ele encontro paz mesmo sem ter morada, mesmo com a testa um pouco arroxeada por tanta cegueira, eu sei que passa

Ézio sabe que precisa dormir e que há vida-fogo em seus quadris, se dói o dorso não é nada, vai ficar bonzinho logo, é só indigestão, agora ele aprendeu a orar, descobriu que não é necessária uma penitência nem joelhos nem mãos dando nós, só a palma na outra, conheceu sua conversa com Deus e agora entende que certas coisas são amargas, mas existem as framboesas, meu amor, para quê tanta urgência ? sem martírios nem maracujá, me dá uma aflição na língua, meu amor, uns arrepios na espinha, não preciso disso EU TENHO DEUS e se tu soubesses e n'Ele ousasses crer diria a ti que em meu quarto a criatura faz a si em estado de deslumbre espargindo brilhos e luzes de cores tão frias, tudo de uma beleza celeste e toco-Lhe a face grande muito grande ! posso perceber tanta braveza em mim depois que tudo se esvai, não há fumaça, não faz vezes de gênio em lâmpadas, vai flutuando e durmo com a soberba de quem sente muito mais porque assim Ele quis

portanto não há nada, não chores não, cuidado quando fores atravessar, observes com zelo os carros que passam parece que pouco importa, mas não, importa muito e nunca saberás porquê, sou Ézio-nascente e sofro de meus devaneios e pudores, mas importa. vai ficar boazinha logo, cuido de tua testa e enquando espalhas por tua face o sumo da fruta que injeto em ti, te tornas uma mulher tão perigosa e valente

deixo em ti meus brilhantes e sigo o tempo de mim e só quando Deus não se faz presente consigo refestelar teu corpo, pois a matéria de quem tenho sido aos poucos se esvai e cada vez mais, meu amor, cada vez mais DEUS VÊ A MIM.



- fragmento do (sic) conto "Ézio".



obs.: sinceras desculpas.

terça-feira, 27 de maio de 2008

impulsiva é a minha pica. eu pensei muito antes. éramos amigos, não lembra? e quanto não durou aquele momento dentro de mim, e quanto não pesei antes e durante e logo depois e agora. acho tudo um grande absurdo, mais uma de minhas opções estúpidas - só pode, já que estou sendo tratada como impulsiva. só pode ser que um merda esteja justamente se dando à descarga depois de mais um de meus correntes partos... pois sim, muito apego por coisa vã.

os orientais entendem a música sob outros prismas. gosto porque, da primeira vez que ouvi, certos estigmas da composição musical em mim impregnados simplesmente desabaram. e eu ficava tonta tentando apanhá-los pelo chão, tão jovem ainda!, eles pulavam me enfeitiçando, me instigando. percebi que meus instintos-estigmas de proteção eram vãos e me deixei levar. nesse dia, foram doze horas de uma musicalidade justa e serena. doze horas de respiração alternada, de temperatura controlada, solas frias, olhar opaco, garganta seca e um copo d'água. foi, sim, em mim experiência única, mas não posso querer infringir o outro. não posso querer dar rótulos ao outro, e achar que com isso sei o que o outro pensa. cacete! pudera saber isso! pudera saber e manipular e tornar de meu grado! mas ninguém sabe.


*** esse blog tá catastrófico. saiam de perto das janelas.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

eu poderia também falar sobre o que quisessem. poderia até ser outra, lançar-me como antes sempre fui de fazer. valha-me não querer mais. valha-me estar aqui a tecer redondilhas de crochê, com linha velha e agulha torta como prêmio pelo tanto que quis, pelo longe que fui. se me pego aos soluços? não, não sou mais líquida. meus olhos secaram desde a primavera, não lembra? não lembra como ainda chorava, apesar de tão dura já a minha vida? apesar do torpor tamanho de minhas ventas e dos alheios que me cercavam encarcerados em tumbas de concreto federal. aqui de fora desse aterro sanitário, sem o enxofre, meus olhos secaram.

devo passar a gola da camisa de trabalho, devo escolher o feijão e refogar o arroz, devo talhar o bife separando-me os nervos, devo passar a vassoura com pano úmido enrolado, devo deixar aberta a janela para entrarem as montanhas pela manhã, devo escovar os dentes antes de sentar ao computador, devo esperar um beijo um presente um jantar, devo sonhar com meus filhos saindo de mim para perto de mim todos eles, devo ligar ao meiodia com voz de cafédamanhã - e ser bomdia, de bomgrado, por todavida.

sábado, 24 de maio de 2008

sobre todas as coisas

se quiserem posso muito bem falar sobre flores, ninhos, animais. se quiserem eu posso o que EU bem quiser. posso brincar de ser teto, de ser folha, de estar certa. se assim bem quiserem, posso inventar que dá certo ser poeta, que é divina a tempestade de existir sendo como se é. posso pontuar o tempo todo, posso parar meu próprio tempo, posso buscar e transformar dor em sossego, eu posso estar em qualquer lugar que seja e ainda brincar de estar aí: olhe para baixo, os dois olhos são meus. eu posso encontrar descanso nessa noite tão bonita e adotar um desses cachorrinhos com olhos tristes redondos de bicho, eu posso ser em mim esses olhos e ninguém nunca vai perceber, nunca. eu posso nunca mais escrever a palavra paixão em nada que seja de mim e ainda assim virar infortúnio, ninguém sabe. vamos fingir todos que há alicerce na saudade e que é de clareza que a vida vive. faz de conta que eu nunca disse que nessa vida me faltava morrer um pouco porque ando sentindo falta até de adoecer. e se eu contar agora que falo igual nordestino e que finalmente psicografei Deus falando de solidão ? não digam por aí que eu fiquei biruta, nem digam que eu não encaixo porque não escrevo poesia, não faço verso, não faço mercê a mares azulentos e molhados. vamos todos brincar de porcelana e raxar um pouquinho, deixar escorrer, ganhar carinho ? vamos todos entender que ser homem não é sopa e que seria necessária a décima parte de muros abaixo para que houvesse, aqui em mim, um caminho

até aí

meu passo sendo leve:

fiz poema até sobre o chão que pisei - todos pisaram.

e ninguém sabe. 

terça-feira, 13 de maio de 2008

ao que grita:

julgo ser proveniente de mim essa dor polpa e fruto de minha própria inabilidade perante a intuição que sempre há, vem chegando em mim moldada de verdades tão brutas coberta de cascas, a verdade e eu com a ponta dos dedos nos vincos, eu, Haydée acariciando farpas navalhas ferrões, em forma de cruz o óleo na testa - testamento de Haydée-menina de Deus buscando nome para o desamparo, abandono, cedência, em círculos ao redor do mesmo meio 
Nada em mim prolonga-se mais de ti, percebes, então, a tristeza ? que tu tenhas dó de tua casmurrice enquanto eu acabo por consumar minhas lembranças enquanto Haydée-mirone querendo conter em si as crueldades ranços o postergar-se diante dos acontecimentos, desencontros, retendo nos olhos o brilho de ser tantas, de ter tantas, e sentir a si mesma miúda parva arroxeada, cheia de nós, truncada - TROCADA
Hans sobe os degraus como quem não sabe que o bem e o mal coexistem e estão circunscritos em sua própria morada, longilíneo Hans permanece a subir como se não houvesse queda, como se o abismo fosse abrigo dos tresvarios de Haydée, imune que está Hans sequer fala coisa qualquer, só pensa no alto, na subida, na Vida, e esquece, o pobre, completamente da Vida que instalou-se por entre os joelhos das duas pessoas que foram, olvidando da alma em espectro de amores que lhe fora oferecida 
como diria eu, Haydée que amo a ti sem que isso parecesse absurdo ?
diz de fronte a esta que agora masca seus próprios pecados, diz que há um perdão a ser pedido que há alma-Hans nos pequenos espaços do teu corpo prolixo, juventude d'O Grande,  Bendito-seja teu júbilo de mim, constato como dados exatos física cálculo: eu morro quinhentas vezes, morro e alma insiste, obstina-se a crescer
pergunto-me se no mérito de ser eu, na rouquidão dos sons de Haydée, se é possível que me ames, como se estivesse tudo apertado em uma nuvem de tranqüilidade, como se o peito em mim - que escorre escorre - pudesse saber dessas sutilezas, como poderia eu de forma qualquer entender, se a própria Vida não percebe ?

segunda-feira, 12 de maio de 2008

cético

ao dizer a verdade -
rubro como ainda não os frutos dessa pimenteira -
seria trágico, arderia em mim
tanto quanto teu ano de espera

deixa-me roncar um sono de olho só
deixa-me acreditar que estou onde deveria
deixa-me
que estou a deixar-te tão certo quanto antes

não me fales em vontade
que de livre fiz-me indesmanchável
como a mácula que deixei de amor no teu corpo
um tanto meu
e que deixaste no meu
até o fim que não pode ainda haver

domingo, 11 de maio de 2008

como se quisesse parar o curso do silêncio, disparo meu verbo quente por outra boca adentro, me deparo com o raciocínio díspar de meus pares, e me percebo ímpar. e de tanta ação, tenho dor-de-cabeça. ela emagrece eu engordo. por trás da cortina que balança suave ao vento, espreita aquele mesmo pássaro, como se não sentisse o frio nem pudesse cantar. aqui de dentro faz ainda mais frio, tanto frio que estou sólido. estou e ela me aquece o peito, me abre as pernas onde o jato me borrifa em partes para dentro, em parte ainda fora, me guardo murcho para dentro das calças e das carapuças. não fosse o horário acordava Délia a me fazer um café. talvez um chá, que acalma os nervos e aquece. um chá com mel adoçado.
cantava de amores e querença enquanto caminhava em sapatos de cetim em plena terra molhada soterrando os saltos e mantendo equilíbrio, andava com disparate que era agressivo sentir a insuficiência de todos os meus recursos, tão parcos, suspensa que estava no desencontro, tinha em mim uma certeza, uma espécie de compensação para um eventual desapontamento baseada sempre na pequenez das coisas, na falta de clareza, para dizer o mínimo, na miudez dos acasos que hoje estão tão apoucados, um suspiro em lamento. de que valem tantos pormenores se nenhum deles seria estopim de Nada, afinal, se agora tudo em mim está suando, sofrendo, assumindo uma existência de terra, aspirando
ando querendo assumir outro haver há tempos pra ver se sai de ti-mim essa névoa irresoluta que repousa como se de mim-ti esperasse um sopro-gesto, é como se a terra por instantes pudesse andar atrás de ti e fosse te brotando florescendo, é como se a terra fosse a mim-tu virando de nós as têmporas antes de matar a sede.

sábado, 10 de maio de 2008

muito longe de estar em paz, navego meus peixes em águas mansas de serenidade e nostalgia. importa-me que sejam mansas, apenas, como a pluma que vai ao vento, e não quando o vento é tanto que agita as águas. a adrenalina do bagunçar das águas do alto mar cambaleante como prancha de surf, cambaleantes como ratos a caminhar em cordas bambas estendidas pelo infinito e para o infinito, cambaleante como o pilar erguido de minha sanidade entristecida e exagerada, cambaleante como a estrada turva da chuva que faz dentro e fora desse carro, eu sigo, aqui dentro eu sigo, mas por fora fico em paz. eu preciso disso, sem medida me faço um tanto maior, ferida por anzóis, embolada em fios de náilom, sim, porém jorrada sangue fora.
se isso fosse amor de verdade, se não quisesse apenas o torpor de minha dúvida... sim, porque minhas águas límpidas sabem trovoadas como poucos poetas. para que meu rompimento comigo mesma, com o projeto do filho que tenho e dos que ainda terei? por que meus pactos de fé poderiam ser dissolvidos assim e apenas, sem mais nada, somente um sorriso, um amor de verbo, uma análise da superfície? e por que, também, tão certa que estou disso tudo, não fico em paz?

não é tão simples. não é tão simples, e o deixar-me fluir pode ser que me preencha em momentos. assim como em momento me preencheste tempestade. o xis é que os momentos de prazer e liberdade, tive, sim, ao teu lado. e os momentos que me encaminham ao que almejo ser/ ter, são todos aqui.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Viver em estado de absurdo como instância contínua, em espera sem súplicas, os bolsos sempre cheios, sempre sem som, o soluço da rua que inteira chorou comigo baixinho, baixinho. Pois não acorde de mim nada que não seja teu, tudo em mim pulsa de tal forma a ser improvável que agora eu ande meio passo para trás. Enxugar de mim todo ranço desses pensamentos repugnantes, resta agora abrir os braços - a ti; e esse diabo que se fez do meu pensar não mais estará entre nossos travesseiros, promessa de mim acredites que sou mulher-árvore e sabes muito bem.
Engolir esse meu segredo feito prece a quem tem sede pois seria preciso a maior das crueldades para proferir de mim essa alma que tenho sido e é aqui mesmo que eu quero ficar.
não era pra ser mesmo. as coisas terminaram, há muito tempo eles nem sequer se procuravam, e agora, por um oportunismo infantil ou menos, ela não se deixaria levar à ruína. quem não sabe ler, que entenda. um equívoco. um equívoco, nada mais. amor, paixão, loucura, isso tudo ela vive agora, com outra pessoa, em igual escala e em mão dupla. de resto, equívoco. de que adianta criar expectativas, puta que pariu, se cada coisa em seu tempo não aconteceu? por que fazer acontecer o que não aconteceu? não houve, é triste, eu sei, pode ser. é irritante até. mas dar brecha pra oportunismo, isso não. não dá pra querer definir o que se vai viver ou deixar de. é precisa a vida.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

ao mesmo tempo que acho isso tudo o máximo, acho tudo isso muito ridículo. feito gente que usa os exemplos dos livros e nada mais. feito gente emblemática que se enaltece, se distancia, e por isso se torna melhor e mais forte. gente que escalona as coisas como se as coisas não fossem as coisas que são, como se fossem apenas coisas. a definição disso ou daquilo às vezes gera sensação de conforto. mas como não só de conforto se pode viver, não só de sensação se pode viver, porra! olhar mais para as coisas e vê-las como realmente são pode resolver as coisas. não que as coisas precisem ser resolvidas, porque, em essência, nem tudo precisa de solução. mas tem coisa que precisa, tem coisa que se não olhada a fundo, se não sentida a fundo pode até enlouquecer. não que a solução e a loucura também não possam ser outras coisas que precisam ser vistas individualmente. Porque às vezes precisam. às vezes, por exemplo, preciso escrever um soneto, outras vezes uma página de diário, noutras as letras me enojam. tem coisa que se explica, coisa de que nem se fala. e como saber se vale a pena? como definir se valer a pena é o que se quer? como optar por fazer simplesmente o que se quer? e o que é o querer, ainda, para que o defina? mas por que tanta definição? não seria melhor estar alheio, e quanto mais alheio mais surpreender(-se)?

terça-feira, 6 de maio de 2008

eu ainda acho que amo pouco
- "e é tanto amor no mundo".
no umbral de quem mutila a si próprio vi teus pés 
teu corpo, por onde andará ?
cristalizou minha memória nas costelas nuas daquele instante e estive inteira em mim por horas
calcei teus pés para não me perder de ti, estivemos, afinal, no mesmo lugar.
para poder morrer em paz
surge em mim um semi-Deus.

domingo, 4 de maio de 2008

para seu inverno
um cálice de meu vinho cara a dentro.
de fazer meu papel mel
tornei-me seco líqüid(ad)o
qual seus olhos grandes barris de carvalho
no mais rígido
rascante
poema

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Se te ausentas faz inverno em mim
como criança sou acolhida
pela minha própria
pureza.

Alma gélida
vida insone.

Não apenas de tuas delongas
fez-se o carma.
É essa cruzada de fogo
esse meu esperar no teu devir
essa persona-infância em que
encontro a mim
ambiciando tatear tuas sombras
e afetos.

É o olho de mim,
contundente.
Escorre feito magma
coisa grande demais.
Castelo de areia

Não vou caber nesse timbre
trêmulo da tua voz
Fico neste mesmo lugar
- pertencendo-ser-sendo !

Percebas que enquanto
gente, sou
pivete:
a mulher é toda poesia de sê-lo.
São jogos agigantados de
passos fáceis.

Difícil é tua mão em
mim
e o quanto quero todas
as proporções.

Que aceites de mim o 
muito que poder ser
teu, no momento
que quiseres.
Eu, enquanto criança
poderia fazer-te feliz.

Porém, não sei
meu bem, não sei mais
brincar e sinto
sinto o tempo todo.